domingo, 28 de agosto de 2011

Miles Davis e o Tempo.

A sensação de visitar a Exposição sobre Miles Davis, no CCBB do Rio, é algo próximo a se assistir a um filme com a tecla Fast Foward apertada, acompanhada de uma excelente trilha sonora. Na verdade a mostra não evidencia nada de novo na vida do músico americano. Nada que já não possa ser lido, por exemplo, na Wikipédia. Estão lá as vicissitudes do músico que se apegava a toda moda que passava, por mais transitória que fosse, seu apego ao dinheiro trazido pela fama, o uso das drogas e seu cinismo bem característico. Apesar disso tudo, em cada sala da exposição, a cada curva e moda em sua carreira, pessoalmente, e contrário aos puristas do Jazz, vi talento em maior ou menor grau, talvez muito menos na fase final, em que se coloca como uma espécie de Pop-Jazz da cultura negra americana, tentando uma igualdade com nomes como Prince ou Michael Jackson. No que concerne a Miles Davis mesmo, o que senti falta na exposição foi à referência ao relacionamento com outros músicos, muitos o consideravam um mau caráter de ordem maior. Nesse sentido, a exposição não entra. Teria sido organizada por um fã mais cego em idolatria, ou a própria presença de objetos importantes, como vários trompetes pertencidos ao músico, exigiu da curadoria uma maior diplomacia quanto à imagem do artista? Lembro-me de uma troca de farpas com o mais contemporâneo Wynton Marsalis, que Miles acusou de ser um jovem querendo ser velho. Marsalis retrucou que Miles era um velho querendo ser um jovem. Para mim, os dois estavam com razão. Parece que só vejo aspectos negativos em Miles, não é? Mas há a música... E a música dele é uma das melhores coisas que o século XX deixou.

O interesse na exposição está na passagem do tempo e como ele se reflete na vida do ser humano, e como nossas opções em cada momento, em cada fase, refletem em nossa personalidade. Esse pensamento ficou muito forte em mim e acho que fica muito forte em cada pessoa que visita a exposição, porque Miles Davis tinha uma relação muito especial com o tempo e a época em que vivia. Não creio que para Miles Davis houve uma época dourada, ou se ele sentia isso, deveria ser muito incidentalmente. Foram 65 anos vividos em conjugação constante do tempo presente e apesar disso, não tenho a impressão que sua essência como ser humano, boa ou má, tenha mudado radicalmente. Mesmo que diante da jaqueta vermelha que vestia nos anos 80, possa se ter a ideia que muito se tenha mudado desde os bem cortados paletós dos anos 40, para mim, sua natureza parece ter se mantido. Tudo registrado em fotografias e músicas. Tenho essa visão porque creio que os modismos dele estão além do interesse exclusivo monetário, evidenciado nas trocas de cartas com os executivos das gravadoras, mas numa necessidade contínua que sempre teve de influenciar continuamente a cultura americana, algo que sem dúvida, conseguiu.